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Por Chico Alencar – Artigo publicado originalmente em O Globo

A repercussão na mídia grande foi mínima, mas as consequências negativas serão máximas.

A Medida Provisória (MP) 795 (em vigor desde agosto), transformada no PLV 36/2017, foi aprovada na Câmara dos Deputados por 208 votos (contra 184). Ela entrega não apenas o nosso petróleo, mas os recursos que a Nação, enquanto Poder Público, deveria receber.

O projeto também é uma afronta ao Acordo de Paris, pois favorece escandalosamente setores poluentes.

O relator foi o deputado Júlio Lopes (PP/RJ), ex-Secretário de Transportes de Cabral (e alvo de investigação por acusação de recebimento de propina na linha 4 do Metrô Rio).

Mal de raiz: o jornal The Guardian revelou, no dia 19 de novembro, tratativas do Ministro do Comércio Exterior do Reino Unido, Greg Hands, com o secretário executivo do Ministério das Minas e Energia, Paulo Pedrosa. Daí a MP ter sido identificada como “MP da British Petroleum e da Shell”.

Explico: a partir de 2018, as empresas poderão deduzir, na determinação do lucro real e da base de cálculo da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), os valores aplicados nas atividades de exploração e produção de jazidas de petróleo e de gás natural. Na prática, a medida reduz os valores que a empresa pagará a título de CSLL e de Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ).

Consequência: dedução integral das despesas de exploração e produção da base de cálculo do imposto devido pelas empresas, favorecendo a indústria estrangeira do setor.

O PLV também suspende o pagamento do Imposto de Importação, do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e da Contribuição para o PIS/Cofins para os bens importados que ficarem definitivamente no país e que forem usados na exploração, no desenvolvimento e na produção de petróleo e derivados.

Consequência: ao facilitar a importação de equipamentos para o setor, acaba com qualquer vantagem competitiva das indústrias naval, siderúrgica e de máquinas nacionais.

Somente para 2018, a previsão de renúncia de receita, decorrente dos incentivos fiscais, chega a R$ 16,4 bilhões! Pelas regras da MP, a participação do Brasil em cada barril – em impostos, royalties e bônus – passará de 59,7% para 40%, uma das mais baixas do mundo. Para fins de comparação, a China possui uma participação de 74%; os Estados Unidos, de 67%; a Rússia, de 66%, e o Reino Unido, de 63%.

O governo Temer, caso o Senado também aprove esse roubo da soberania nacional, estará criando um cenário de triplas perdas:

1) subsidiando setores econômicos que alimentam o aquecimento global e vão na contramão dos Acordos dos quais somos signatários, que preveem a redução de emissões;

2) desviando subsídios que poderiam se (o “que” atrai a partícula “se”) dirigir a alternativas econômicas de baixa emissão de carbono;

3) diminuindo as receitas públicas que poderiam financiar políticas sociais de saúde, educação, previdência, emprego e renda, assistência social e preservação ambiental.

É preciso dizer “não” (as aspas aqui têm o intuito de indicar uma fala. Como em: é preciso dizer “olá” para o futuro) a esse crime de lesa-pátria, altamente poluidor e antinacional.  A cidadania precisa conferir como votou cada deputado federal de cada estado e pressionar os senadores. Agora! Já!

PS: Joesley Batista, da JBS, ficou calado na CPI que investiga as falcatruas de suas empresas. Ajudaria o país se ao menos dissesse quanto seus questionadores – no mínimo 15 parlamentares do colegiado – receberam do ex-amigo, hoje chamado por eles (e por Temer) de “mafioso” e “bandidão”.

Foi a sessão de “cuspir no prato em que se comeu”.