Por Renato Cinco, vereador do PSOL Carioca – Acompanhe a série “Cuidando de quem? Os dois anos de Crivella”
O planejamento urbano pode ser entendido como ações do Estado, como ente público responsável, para melhorar as condições de vida na cidade. Assistimos, em período recente, nas cidades brasileiras, grandes intervenções do Estado na instância municipal que alteraram consideravelmente a dinâmica urbana, porém questionáveis do ponto de vista da melhoria das condições de vida e trabalho na cidade.
Precedentes
Exemplo de importante política pública de planejamento urbano que não serviu para a alteração da qualidade de vida da classe trabalhadora na cidade, o Programa Minha Casa, Minha Vida. Criado em 2009, o Programa anunciou eliminar o déficit habitacional e teve como meta a construção de 2 milhões de habitações, até 2014. Contudo, segundo a pesquisadora Raquel Rolnik[1], o PMCMV, se afastou da diretriz urbanística do Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social (SNHIS), e suas normas não foram pautadas para o enfrentamento do déficit habitacional, mas sim por fatores macroeconômicos e setoriais. Municípios e estados que tinham sistemas próprios de habitação social abriram mão destes em detrimento do PMCMV, como única política de habitação. Esta política serviu de medida emergencial para a crise do capital mundial em 2008 e os investimentos em Moradia aqueceram a economia através do setor da construção civil e o emprego de mão-de-obra barata e foi elemento de política econômica anticíclica de recessão. Desta maneira, convergiu interesses de construtoras, dos governos federal e locais e do mercado imobiliário que atraiu capitais para a formação de um banco de terras, explodindo o preço da moradia na cidades.
As explosões urbanas de 2013 demonstraram a insatisfação com a vida nas cidades do Brasil. As manifestações que iniciaram com o aumento das passagens foram a fagulha sobre as péssimas condições na Cidade – os altos preços do custo de vida, as dificuldades de mobilidade e transporte público, a ausência de qualidade nos bens e serviços públicos e o próprio direito à cidade. As jornadas de junho exigiram que os gastos nos mega-eventos para atenderem aos padrões FIFA e COE fossem do mesmo patamar para os direitos sociais[2]. As questões que mobilizaram 2013 permanecem sobre a qualidade do transporte, moradia, educação e saúde.
No Rio de Janeiro, as gestões de Eduardo Paes (2008-2012, 2013-2016) foram marcadas por um ordenamento urbano elitista, reatualizando a histórica segregação social na promoção da higienização urbana de espaços de interesse do capital. Realizou grandes remoções que retiraram as trabalhadoras e os trabalhadores mais pobres de áreas de interesse da especulação imobiliária, como a Vila Autódromo, colocando-as/os para fora da dinâmica socioeconômica da cidade. Abriu espaço para os investimentos do capital sobre áreas públicas como a região do Porto, ao invés de direcioná-las para a habitação de interesse social nas áreas centrais da cidade.
Governo Crivella
Os dois anos da gestão municipal de Marcelo Crivella – que na campanha eleitoral prometeu cuidar das pessoas – realizou a política de diminuição de direitos fundamentais. A dinâmica de ajustes e arrochos é adotada sobre as/os trabalhadores promovendo cortes nos orçamentos de serviços públicos, como Saúde, Educação, Prevenção de Enchentes, Ações de Meio Ambiente e Conservação, trazendo danos pra a vida na cidade.
No início de 2017, o governo Crivella apresentou o Plano de Metas com indicações de mais remoções pela cidade, com destaque para Rio das Pedras e o Maciço da Tijuca. Tratava ainda de construções de unidades habitacionais e urbanização em comunidades sem deixar claro onde, como e com quais recursos a prefeitura realizaria as obras indicadas. O prefeito assinou decretos formando Grupos de estudo e trabalho relativos a “evitar” ocupações e de “reassentamento” sem ouvir movimentos sociais e população. Nestes dois anos, moradores de diversas partes da cidade tentam ser recebidos pelo Prefeito e Secretaria de Habitação sem nenhuma resposta.
Índio da Costa, secretário de urbanismo, infraestrutura e habitação de Crivella, preparou um pacote de projetos visando modificar os códigos urbanísticos municipais: Lei de Uso e Ocupação do Solo, Código de Licenciamento e Fiscalização de Obras Públicas, Lei de Parcelamento do Solo Urbano e o Código de Obras e Edificações. Destes só o último foi aprovado. O discurso era que as propostas visavam diminuir a burocracia, mas sem dúvida se trata de uma flexibilização de regras e parâmetros para beneficiar o mercado.
O governo mantém aumentos de impostos e passagens e não consegue reverter os péssimos serviços como o oferecido pela máfia das empresas de ônibus. Talvez, o exemplo mais perverso e diretamente sentido por trabalhadores do setor e a população vem sendo o ataque ao direito à saúde pública no município com a diminuição das equipes de Saúde Primária, com a péssima situação material de Clínicas da Família, Centros, Postos e Hospitais Municipais.
A prefeitura promove o início da decadência de serviços municipais para dar conta dos ajustes das contas. A gentrificação, a segregação e a desigualdade foram aprofundadas nas ações urbanas e o modelo de políticas públicas adotado se mostra insustentável frente aos investimentos estatais realizados. As intervenções urbanas realizadas na cidade do Rio de Janeiro, no período anterior, infelizmente, não melhoraram a vida da classe trabalhadora, ao ponto de nos aproximarmos do direito à cidade como o acesso adequado a bens e serviços públicos.
Precisamos ter iniciativas de políticas públicas que articulem um projeto popular participativo de cidade podendo acumular para uma mudança necessária às trabalhadoras e trabalhadores. Seguem algumas:
Projeto de Emenda à Lei Orgânica Municipal 30/2015, que RECONHECE OS DIREITOS DOS POVOS E COMUNIDADES TRADICIONAIS DO MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO. Autor Vereador Renato Cinco (PSOL)
http://mail.camara.rj.gov.br/APL/Legislativos/scpro1720.nsf/0/832580830061F31883257EEC005A0439?OpenDocument
Projeto de Lei 211/2017, que REGULAMENTA A OUTORGA ONEROSA DE ALTERAÇÃO DE USO DO SOLO, Autor Vereador Renato Cinco (PSOL)
http://mail.camara.rj.gov.br/Apl/Legislativos/scpro1720.nsf/6271daed3fe75f1603257abe006c66e4/c341f8e245011f7c83258122005da0e2?OpenDocument
Projeto de Lei 1396/2012 substitutivo, que INSTITUI, NOS TERMOS DOS ARTIGOS 5º A 8º DO ESTATUTO DA CIDADE, INSTRUMENTOS PARA O CUMPRIMENTO DA FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE NO MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO E DÁ OUTRAS PROVIDÊNCIAS [regulamenta a Utilização Compulsória], Autores Vereador@s Renato Cinco, Paulo Pinheiro, Marielle Franco, Tarcísio Motta, David Miranda e Leonel Brizola (PSOL)
http://mail.camara.rj.gov.br/Apl/Legislativos/scpro1720.nsf/6271daed3fe75f1603257abe006c66e4/e5da5565f0392a59832581370065eeb9?OpenDocument
Projeto de Lei 388/2017, que DETERMINA O PROVIMENTO PRIORITÁRIO DE ÁGUA E SANEAMENTO EM ÁREAS POPULARES, Autor Vereador Renato Cinco (PSOL)
http://mail.camara.rj.gov.br/Apl/Legislativos/scpro1720.nsf/6271daed3fe75f1603257abe006c66e4/4f255b0a0448b0058325818600571716?OpenDocument
Projeto de Lei 763/2018, que DECLARA O IMÓVEL LOCALIZADO NA RUA PEDRO ERNESTO N° 125 NO BAIRRO DA GAMBOA, COMO ÁREA DE ESPECIAL INTERESSE SOCIAL, PARA FINS DE REGULARIZAÇÃO URBANÍSTICA, Autor Vereador Renato Cinco (PSOL)
http://mail.camara.rj.gov.br/Apl/Legislativos/scpro1720.nsf/6271daed3fe75f1603257abe006c66e4/415e54dc37de5a468325826b006c2f3c?OpenDocument
Projeto de Lei 872/2018, que DECLARA O IMÓVEL LOCALIZADO NA RUA ALCINDO GUANABARA, Nº 20 NO BAIRRO DO CENTRO, COMO ÁREA DE ESPECIAL INTERESSE SOCIAL, PARA FINS DE REGULARIZAÇÃO URBANÍSTICA, Autor Vereador Renato Cinco (PSOL)
http://mail.camara.rj.gov.br/Apl/Legislativos/scpro1720.nsf/6271daed3fe75f1603257abe006c66e4/785c0c60dad789a5832582a30064598d?OpenDocument
Projeto de Lei Complementar 30/2017, que REGULAMENTA O PLANO MUNICIPAL DE HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL PARA A CIDADE DO RIO DE JANEIRO E ALTERA A LEI COMPLEMENTAR 111/2011, Autor Vereador Renato Cinco (PSOL)
http://mail.camara.rj.gov.br/Apl/Legislativos/scpro1720.nsf/6271daed3fe75f1603257abe006c66e4/1a629b8502963f0b8325817000650112?OpenDocument
Projeto de Lei Complementar 88/2018, que DETERMINA QUE AS LICITAÇÕES DE OBRAS PÚBLICAS DE GRANDE VULTO SEJAM ACOMPANHADAS DE PROJETO EXECUTIVO PREVIAMENTE ELABORADO, Autor Vereador Renato Cinco (PSOL)
http://mail.camara.rj.gov.br/Apl/Legislativos/scpro1720.nsf/6271daed3fe75f1603257abe006c66e4/11b873eaf42f649a83258340006662de?OpenDocument
[1] Ver Rolnik, Raquel. https://raquelrolnik.wordpress.com/2014/11/10/programa-minha-casa-minha-vida-precisa-ser-avaliado-nota-publica-da-rede-cidade-e-moradia/. Especificamente pesquisa ROLNIK, Raquel et al. O Programa Minha Casa Minha Vida nas regiões metropolitanas de São Paulo e Campinas: aspectos socioespaciais e segregação. Cad. Metrop. [online]. 2015, vol.17, n.33, pp.127-154. ISSN 1517-2422. http://dx.doi.org/10.1590/2236-9996.2015-3306.
[2] Ver Cidades Rebeldes: passe livre e as manifestações que tomaram as ruas do Brasil. Coleção Tinta Vermelha. Org. David Harvey. São Paulo: Boitempo, 2013.
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