Nesta terça, 22, a bancada do PSOL Carioca na Câmara do Rio votou contrária ao projeto Reviver Centro. Confira a análise da nossa posição:
Em primeiro lugar, desde o anúncio da intenção da prefeitura em aprovar o projeto, nos debruçamos sobre o mesmo, conversamos e debatemos com o governo, com especialistas, trabalhadores e moradores impactados. Assim, somos em plenário o resultado de um acúmulo coletivo. Achamos que reviver o centro é fundamental. Mas três perguntas precisam ser respondidas:
– Por que o centro está esvaziado?
Sem responder a isso não sabemos qual problema estamos querendo corrigir.
– O que precisamos fazer para reviver o centro?
Sem saber essa resposta, não sabemos qual objetivo alcançar.
– Vale tudo pra reviver o centro? Quais os limites desse projeto?
Além disso, acreditamos que o esvaziamento do Centro é resultado de três crises: a Sanitária, a Econômica e a Urbana. Portanto, NÃO há qualquer hipótese de recuperação da área central sem que se resolva a pandemia. As ações mais potentes de recuperação são aquelas que fariam a pandemia acabar o mais rápido possível. Desta forma, fazer a discussão de benefícios nesse cenário é discutir com a faca no pescoço. O Centro é uma área resiliente e será uma das primeiras a se recuperar no pós-pandemia, com ou sem Reviver Centro. Discutir isso sob esse cenário é dar benefícios excessivos a médio e longo prazos.
Além disso, é irreal achar que o Reviver Centro sozinho seria capaz de ‘salvar o Centro do Rio’ diante do cenário de crise econômica nacional que está colocado. A revitalização do centro não será capaz de modificar o preço do barril do petróleo e das commodities, por exemplo.
Não é possível recuperar o Centro sem recuperar a cidade do Rio como um todo. Esta parte da cidade nunca será uma ‘ilha paradisíaca’ capaz de esconder o que se tornou o Rio: milícias dominando territórios, uma cidade extremamente desigual, com falta de acesso à moradia e saneamento, sistema de transportes disfuncional etc.
Essa cidade que temos hoje é resultado dos últimos 20 anos de gestões municipais que se comportaram rigorosamente da mesma forma: trataram a cidade como um balcão de negócios, com o interesse de pequenos grupos se sobrepondo aos da maioria da população.
A pergunta então é: O que precisamos fazer para Reviver o Centro?
Reviver o centro passa por ocupar o centro com gente, com atividade humana, moradia, diversidade. Em um bom ambiente urbano, democrático, seguro, diverso. Mas também um ambiente inclusivo, com acesso também à moradia.
Um ambiente que não persiga os camelôs e trabalhadores informais; que busque dar oportunidade de emprego e moradia aos que não têm. Um ambiente em que a sensação de segurança seja resultado de um espaço público vivo e não da sua militarização.
Uma cidade antidemocrática
O outro elemento fundamental neste projeto é que o Reviver Centro trata o próprio Centro de forma bastante antidemocrática e já vimos isso através do Decreto da prefeitura que hostiliza trabalhadores informais no espaço urbano.
Esses trabalhadores são fundamentais para o funcionamento do Centro. O Centro também depende deles. Mas a prefeitura se nega ao diálogo e participação para que o ordenamento, tão ressaltado pelo secretário, seja feito em conjunto com esses trabalhadores e não de cima para baixo.
Mas, afinal, a primeira revitalização que o projeto efetivamente faz não é a do centro, mas da política de Choque de Ordem, dos mandatos anteriores do Prefeito Eduardo Paes.
Operação Interligada e IPTU Progressivo
A Operação interligada parte do princípio que a revitalização do Centro depende de interesses econômicos que precisam ser incentivados. Tanto faz, para a Operação Interligada, se pessoas vão ocupar o centro, ou mesmo quem são essas pessoas.
A lógica da Operação Interligada é de que é preciso oferecer vantagens para que incorporadores imobiliários desinteressados no centro passem a ver nessa área uma oportunidade de negócios. Assim, cria-se um incentivo econômico gigantesco para que os incorporadores supostamente façam aquilo que é obrigação constitucional: dar função social à propriedade.
Porém, a única coisa que a operação interligada condiciona é a realização de reformas nos imóveis. Ou seja, ao final do processo podemos ter imóveis reformados, mas vazios no centro, que não cumpriram com o objetivo do programa, mas que permitiram aos incorporadores imobiliários ter ganhos milionários em áreas valorizadas da cidade.
IPTU Progressivo
Um instrumento que era tão fundamental, foi retirado do projeto pelo governo Paes. Algo primordial para que o Parcelamento, Edificação e Utilização compulsória tenham efetividade. Entendemos que estes três elementos não podem ser mera ‘advertência’ da prefeitura aos proprietários que há décadas ficam especulando com terrenos vazios em áreas onde pessoas poderiam morar.
O que estamos propondo na verdade foi apresentado pelo Secretário Fajardo na versão preliminar do projeto, que por sinal, embora estivesse menos refinada, ia numa direção muito melhor do que a versão atual do projeto. E nessa ritirada da proposta, a gente vê uma política de dois pesos e duas medidas:
Quando o governo é questionado sobre o Reviver Centro estar em discussão durante a revisão do plano diretor, diz que a cidade não pode parar. Mas quando é questionado sobre a inclusão do IPTU progressivo, o governo diz que não cabe, pq isso seria assunto para o próximo plano diretor.
Ora, ou vale discutir antes da revisão do plano diretor – e portanto deveríamos discutir o IPTU progressivo no âmbito do reviver, sim – ou deveríamos esperar o novo plano diretor para fazer o reviver centro. O que não pode é ter dois pesos e duas medidas.
Por isso entendemos que a regulamentação do IPTU progressivo desde já é fundamental para que o instrumento seja autoaplicável. Sem prejuízo para que no momento da aprovação do plano diretor a gente aprove aqui uma lei fazendo a modificação desses artigos para adequação. O resto é desculpa do governo para recuar em um instrumento tão importante para a democratização do acesso à moradia e o combate à especulação imobiliária na nossa cidade.
Sendo assim, entendemos que o Reviver parte de um sentimento nobre, mas que não se concretiza no texto do projeto de lei. Embora o projeto tenha méritos em diversas áreas, ele tem falhas fundamentais:
1. É excludente para trabalhadores informais que são fundamentais para o funcionamento do Centro e dependem desse trabalho para sua sobrevivência.
2. É um projeto tímido nas políticas habitacionais. Muitas delas frágeis, pouco delimitadas e com pouca prioridade para os que mais precisam de moradia.
3. É um projeto que exclui instrumentos centrais para uma política urbana mais democrática, como o IPTU Progressivo no Tempo
4. E inclui benefícios econômicos descabidos ao mercado imobiliário, através da Operação Interligada, incentivando o caráter especulativo do projeto, dando o direito à construir em áreas hiper valorizadas da cidade.
Em síntese, o Reviver Centro é um projeto que fala muito em revitalização do Centro, mas a única revitalização que garante é a da especulação imobiliária.
Bancada do PSOL Carioca
Tarcísio Motta (líder)
Chico Alencar
Dr. Marcos Paulo
Monica Benicio
Paulo Pinheiro
Thaís Ferreira
William Siri