Nesta tarde de quarta-feira, 7 de novembro, o plenário da Câmara Municipal do Rio deve votar o projeto de lei PL 101/2017 de autoria da bancada do PSOL e apresentada pelo líder do partido na casa, vereador Tarcísio Motta.

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O projeto propõe o fim da isenção de ISS – imposto municipal sobre serviços, que beneficia especificamente as empresas de ônibus da cidade de forma assombrosa. Barata e sua turma pagam apenas 0,01%, quando o normal são de 2% a 3% do valor do serviço. Com isso, a prefeitura deixa de arrecadar algo em torno de R$ 60 milhões, ficando com apenas R$ 200 mil anualmente. Além do nítido privilégio, a aprovação do projeto no passado não significou o barateamento da passagem, mas sim, conferiu lucro indevido aos mesmos empresários de sempre.

Em outubro, a primeira votação passou na Câmara. Entretanto, logo após a nossa vitória, a Secretaria Municipal de Transportes – SMTR, enviou nota aos vereadores com informações inverídicas e com clara defesa dos interesses dos empresários de ônibus. É muito triste perceber uma prefeitura que mente e engana a todos com o intuito de continuar a beneficiar quem não precisa para tirar de milhões de cariocas que pagam muito mais caro do que deveria pelo simples direito de se deslocar na cidade. Abaixo, a nota da bancada do PSOL Carioca refutando a nota da SMTR:

RESPOSTA A NOTA DE ESCLARECIMENTO DA SMTR SOBRE A ALÍQUOTA DO ISS PARA SPPO/RJ

No contexto da discussão acerca do fim da “isenção” do ISS(de 0,01% para 2%), para os ônibus municipais, em pauta na presente Casa pelo PL 101/2017, da bancada do PSOL, a SMTR enviou aos vereadores nota de esclarecimento apontando a necessidade da manutenção do ISS atual para a manutenção da tarifa de ônibus.

No entanto, infelizmente, na tentativa de justificar o referido benefício, a SMTR apresenta uma série de inverdades que foram já apontadas pela justiça, pela MPERJ, TCM e pelo relatório alternativo da CPI dos Ônibus.

  1. Da falta relação da isenção do ISS com o Bilhete único e a relativização do fluxo de caixa das propostas comerciais

O primeiro argumento utilizado pela SMTR é de que a isenção do ISS seria necessária para viabilizar o bilhete único. A única comprovação de tal afirmação é a justificativa do projeto de lei 683/2010. Ocorre que na mencionada justificativa, a parte que não se atêm a possibilidade legal da isenção,é a que se transcreve abaixo:

“O transporte coletivo constitui serviço público essencial, especialmente para as camadas mais humildes da população, constituindo para milhões de brasileiros o único meio de locomoção para seu sustento, educação ou lazer. As longas distâncias impostas pelo ambiente urbano impõem a muitos a necessidade de utilização de vários transportes, fato que acaba por distanciar o transporte coletivo do ideal da modicidade tarifária.

Ademais, como é notório, somente o estímulo à utilização do transporte coletivo pode solucionar os problemas ambientais provenientes das emissões gasosas relacionadas aos automóveis, bem como propiciar a melhora no fluxo de trânsito.

A redução de alíquota do ISS, preconizada na presente proposta, está inserida no bojo de um conjunto de medidas que visam a otimizar e racionalizar o desenvolvimento do transporte coletivo em nossa Cidade. Nesta linha, cumpre mencionar o Ato de Justificação da Outorga de Concessão da Prestação do Serviço Público de Transporte Coletivo de Passageiros por Ônibus, publicado no D.O. RIO de 29 de abril de 2010.” (grifos nosso)

Portanto, não há nada, muito menos algum cálculo, que faça aferir da justificativa do PL 683/2010, que a viabilidade do bilhete único carioca, dependeu da referida isenção. Utilizar a vagueza desse texto, que fala genericamente de modicidade tarifária como comprovação de que esse benefício foi concedido para viabilizar o bilhete único, é absolutamente inconsistente.

Mas pelo contrário, na tentativa de relacionar essa isenção ao bilhete único, a SMTR também cita, como segundo argumento da nota, o cálculo do estudo de fluxo do edital e das propostas comerciais. Ocorre, que tal estudo se referia a a possibilidade da isenção do ISS, no cálculo da tarifa inicial de R$2,40 estipulada pelo contrato. Mas isso não estava relacionada a questão do bilhete único carioca, muito menos foi colocada em qualquer momento como contrapartida do Município pelo bilhete único, tendo em vista que ali se fixava a tarifa UNITÁRIA, do sistema, e não a integração. Portanto, não encontra lastro com a realidade a referida afirmação.

Ademais, os particulares assumiram o risco de ter ou não aprovada a referida isenção. Isso porque a Lei do ISS só foi aprovada em 27/09/2010, enquanto os contratos de concessão foram assinados em 17/09/2010. Portanto, no momento das propostas realizadas para ganhar a concessão, nenhuma empresa tinha certeza de que a isenção seria aprovada – tendo em vista que independente de quaisquer promessas do Prefeito, a competência para aprovar ou não a matéria era da Câmara.

 

  1. Gratuidades: eram proibidas pelo edital de licitação e os repasses foram ilegais

Por fim, a SMTR aponta a questão das gratuidades e do seu suposto ônus aos concessionários. Todavia, NÃO FOI APROVADA NO EDITAL OU NO CONTRATO DE CONCESSÃO NENHUMA CONTRAPARTIDA PARA AS GRATUIDADES. A última versão do edital de concessão CO 10/2010, foi arquivado com errata, em virtude das determinações do TCM,publicada em 28/07/2010, incluindo o subitem 17.08 com o seguinte texto: “17.08 – O licitante não poderá considerar, em sua Proposta Comercial, qualquer repasse do Poder Concedente como compensação as gratuidades legais, atualmente em vigor.”

Além disso, o TCM, no PA 040.005505.2010, chamou a atenção para o fato que, logo após a assinatura dos contratos de concessão, em 01/10/2010 foi editado o Decreto Nº 32.842 prevendo contrapartidas por parte da Secretaria Municipal de Educação para as gratuidades dos alunos da rede municipal de ensino (p. 2373). Neste mesmo processo foi constatada a transferência de recursos, de cerca de 50 milhões de reais, da Secretaria Municipal de Educação para o Sindicato das Empresas de Ônibus do Rio de Janeiro mediada pela celebração dos Convênios n. 277/2010 e 08/2012. Conclui o Conselheiro do TCM no Voto n. 358-2012 que “evidencia-se, mais uma vez, um completo desrespeito ao procedimento licitatório e à Lei Orgânica do Município – LOM que preceitua em seu art. 403 a gratuidade dos estudantes” (p. 0094).

Portanto, a interrupção do repasse mencionada na nota da SMTR foi determinada pelo TCM porque o referido repasse era flagrantemente ILEGAL e NÃO ESTAVA PREVISTO NO CONTRATO.Portanto, não interfere no equilíbrio econômico financeiro do contrato de concessão a favor das empresas, mas sim a favor da população que deveria ser ressarcida desses valores pagos.

Mas não apenas isso, após essa interrupção foi INCORPORADO na tarifa 0,13 centavos através do decreto de número 39.707, que atualizou a tarifa de ônibus de R$ 3,00 para R$ 3,40 entrou em vigor em 3 de janeiro de 2015.Ou seja, após interrompido o repasse ilegal, eles ainda continuaram recebendo contrapartida pelas gratuidades, através de cada passagem paga pelo usuário de ônibus.

As incorporações de custos com ar condicionado e gratuidades, realizadas através do supramencionado Decreto Municipal, foram de respectivamente R$ 0,058 e R$ 0,131, que se somados a tarifa calculada pela fórmula paramétrica contratual, contribuiu para uma tarifa final de R$ 3,40. Essa contribuição (arredondada) de 20 centavos referentes às incorporações citadas são consideradas ilegais pelas recentes intervenções da justiça. Em agosto de 2017 a desembargadora Mônica Santos considerou abusivo o aumento de R$ 0,20 referente às incorporações de ar condicionado e gratuidades. Desta maneira,o Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPRJ) obteve junto a 20ª Câmara Civil do Tribunal de Justiça uma decisão que obrigou a redução em R$ 0,20 dessa tarifa, como consta nos autos do Processo nº 0001667-91.2015.8.19.0001.

Ainda, a Desembargadora Mônica Sardas, apontou na sua decisão o seguinte:

Uma minuciosa leitura do contrato de concessão leva à certeza que a gratuidade sempre foi prevista e imposta como dever às Concessionárias, que se beneficiaram durante anos dos repasses na ordem de R$ 50.000.000,00 (cinquenta milhões). Seguem as cláusulas contratuais que se referem à gratuidade: 5.5 – a CONCESSIONÁRIA não pode recusar usuários que gozem de gratuidade decorrente das normas aplicáveis. 9.2 – Constituem obrigações da CONCESSIONÁRIA, sem prejuízo de outras previstas na legislação aplicável e nos ANEXOS ao EDITAL e ao presente CONTRATO DE CONCESSÃO: […] IV– aceitar as gratuidades e abatimentos da tarifa impostas pela legislação e normas regulamentárias aplicáveis; […] XXV- assegurar a fiel observância dos direitos dos usuários dos serviços; 24.3 – o PODER CONCEDENTE estabelecerá, nos termos da Lei e através de regulamento próprio, as formas de eventuais contrapartidas às gratuidades previstas na legislação para o serviço de transporte coletivo de passageiros por ônibus.

  1. Da impossibilidade de manutenção de benefício fiscal sem transparência: a necessidade de cumprimento da obrigação legal dos dados financeiros auditados pelas concessionárias

Dessa forma, não são consistentes os argumentos demonstrados pela SMTR. E ainda, caberia pontar que como qualquer benefício fiscal, esse não é certo e muito menos precisa se manter para sempre. Os particulares assumem o risco, própria a modalidade negocial, de ter ou não esse benefício concedido e mantido ao longo do tempo. Prerrogativa dessa Câmara que volta a discutir a matéria, com outra composição e noutra conjuntura. Sobretudo, tendo em vista as inúmeras denúncias das empresas de ônibus e o fato delas não cumprirem obrigação de manterem seus dados financeiros auditados.

Ademais, configura conduta, no mínimo imoral da administração pública, manter benefício fiscal sem que as empresas de ônibus garantam o mínimo de transparência exigidos pela legislação e pelo contrato.

É obrigação legal das empresas disponibilizarem suas respectivas demonstrações financeiras consolidadas auditadas. Essa obrigação poderia decorrer simplesmente do fato de serem concessionárias de serviço público e precisarem ser regidas pelos princípios da administração pública quando da prestação do serviço público.

Ainda, no caso em comento há legislação específica sobre o tema, oriunda de controvérsia exatamente da falta de transparência das empresas de ônibus do Rio de Janeiro, que tornou obrigatória a auditoria dos dados financeiros das empresas, no Decreto 38.276/2014, art. 2°, inciso V. No entanto, mesmo quando contratadas as auditorias pelas concessionárias de ônibus essas não conseguem emitir parecer conclusivo no sentido de referendarem os dados financeiros das empresas de ônibus.

Dessa forma, viola diretamente o princípio da legalidade e moralidade administrativa a manutenção de benefício fiscal que não leve em consideração dados financeiros auditados, pois não se torna possível aferir a necessidade e a utilização do benefício.

Ressalta-se, por fim, que a bancada do PSOL não é contrária a esse tipo de benefício fiscal em teoria, no caso de serviços públicos essenciais, que visam subsidiar uma tarifa mais baixa. A depender da situação ele pode ser benéfico para a população, mas isso teria que ser visto caso a caso. O que podemos verificar no caso do Rio de Janeiro é de que não tem essa finalidade de garantir a modicidade tarifária, mas sim de aumentar o super lucro das empresas de ônibus.

Nesse sentido, tendo em vista inclusive, o momento que o Município do Rio de Janeiro vive, em que milhões estão sendo cortados da saúde pública básica da população, não é razoável que a Prefeitura mantenha o referido benefício do ISS aos Ônibus, que repita-se, apenas beneficia os empresários do setor, sem nenhuma contrapartida para a sociedade.

Rio de Janeiro, 05 de novembro de 2018.

Bancada do PSOL Carioca na Câmara Municipal

Vereadores:
Tarcísio Motta – líder
Babá
David Miranda
Leonel Brizola Neto
Paulo Pinheiro
Renato Cinco